Era noite de Natal. Pela primeira vez em muitos anos, aquela família iria passar todo o Natal em casa. Com as dificuldades financeiras se agravando, os pais não tinham recursos para promover uma festa nem para ajudar na partilha que costumavam fazer na casa dos avós paternos.
Naquele ano, as coisas estavam especialmente difíceis, e todo o dinheiro que conseguiram era destinado a pagar as contas e comprar alimentos. Nem mesmo os presentes, por mais simples que fossem, puderam ser comprados. Contudo, os filhos, ainda tristes por não receberem nada, estavam alegres, pois tinham seus pais ali com eles.
Essa família nunca viveu na fartura, mas os pais sempre asseguraram que nada faltasse para os filhos. O pai, com toda simplicidade, insistia em manter uma tradição: aos fins de semana, pelo menos um dia, trazia para casa uma “cuca”, seja ela de banana, farofa, ou creme. A alegria irrompia quando todos se sentavam à mesa para saborear a guloseima, acompanhada de refrigerante ou, às vezes, de suco em pó misturado à água. O que realmente importava era a união.
“Podia faltar tudo, menos a comida”, dizia o pai, que muitas vezes ia a pé para o trabalho, economizando o dinheiro da passagem para comprar leite, pão, linguiça ou ovos. O sacrifício valia a pena ao ver o sorriso no rosto dos filhos, mesmo que seu coração estivesse triste por não poder dar mais.
Como canta a música do Padre Zezinho: “Faltava tudo, mas a gente nem ligava. O importante não faltava: seu sorriso e seu olhar.” Assim viviam, com pouco, mas com alegria, e naquele Natal não seria diferente. A ceia seria simples, mas para os pais, o mais importante era celebrar o nascimento de Jesus com seus filhos.
Sabendo que alguns parentes próximos também enfrentavam suas batalhas diárias, o pai, percebendo que estariam sozinhos naquela noite santa, decidiu que seu filho mais velho deveria convidar um primo para compartilhar a ceia. Ao instruí-lo, lembrou que, embora fosse uma ceia humilde, o que realmente importava era viver momentos de alegria juntos, alimentando a esperança de dias melhores.
O menino ficou animado com a ideia do pai — mais pessoas para celebrar e brincar! Saiu alegremente, até cantando uma música de Natal, mas não imaginava que seu entusiasmo poderia ser desfeito em segundos.
A casa dos primos estava a apenas 100 metros de distância. Ao bater à porta, com olhos brilhando e coração contente, aguardou ansiosamente a resposta. Porém, ao ser recebido pela prima de seu pai, e ao fazer o convite, a felicidade foi substituída por desilusão. O primo de seu pai, em tom desdenhoso, exclamou: “Para comer arroz com frango, eu como em casa!” A porta se fechou diante dele, e a criança, aturdida, sentiu seu mundo desabar.
Com o coração pesado, parou e pensou em como contaria aos pais o que acabara de ouvir. A angústia tomou conta. Ele não queria que a tristeza ofuscasse o esforço que seus pais faziam para ter uma noite especial. Tomou a difícil decisão de esconder a verdade, decidindo que aquele homem não destruiria a alegria de seus pais.
Enquanto caminhava de volta, cada passo pesava como se o levasse a uma eternidade. Ao abrir a porta de casa, sentiu que as lágrimas precisavam ser contidas. O pai o acolheu com um sorriso, perguntando por que demorara. Ele, respirando fundo, respondeu que seus primos preferiram não ir, e o pai, compreensivamente, já esperava essa resposta.
Naquela noite, enquanto a comida descia amarga, a alegria brotava de forma forçada no rosto do menino. Contudo, mesmo mentindo, sentia uma leveza ao ver a felicidade dos pais. O amor estava presente, mesmo que disfarçado pela dor.
Os anos passaram, e aquele menino cresceu, acompanhando o envelhecer dos pais. Juntos, celebraram muitas outras noites de Natal. Algumas cheias de convidados, outras apenas com a família unida. Mas a felicidade sempre imperava, pois buscavam celebrar o amor, o mistério da vida, e o nascimento de Jesus, que veio ao mundo para oferecer a salvação à humanidade.
Aquele Natal se tornou um marco na vida do menino, uma lição sobre o verdadeiro espírito do Natal. A partilha e o amor eram os mais preciosos presentes que poderiam existir, e em cada ceia, mesmo nas mais simples, o coração da família se enchia de esperança e gratidão, uma verdadeira celebração da presença divina em suas vidas.